…quando “Sleep Walk” toca…
Pensei que ia demorar tanto, mas acabou que eu estava no mesmo inferno em que você estava, e não está mais, com todas as tribulações que passa você está, você me transmite essa mesma paz e decisão de querer sonhar.
Pensei que nunca mais iria escutar Sleep Walk…
Pensei que morreria sozinho. Que meus sonhos estariam jogados na lama e a música tocou de novo dentro de mim… Sim, quando ela tocou dentro de mim, ela anunciou um pássaro encharcado de gasolina, cantando na minha janela, uma flor brotando e um alívio no meu peito.
Algo de especial acontece. Piso em nuvens, escombros e em cinzas… E aí, acho que imagino coisas, ou sou transportado a elas.
Tenho dezoito anos de novo e “Sleep Walk” se repete de novo. O inferno começou quando um carro pegou fogo e dessa vez o céu começou quando o museu nacional pegou fogo… Tudo que era antigo queimou… Você queimou tudo que era velho com o fogo que saiu de mim e pôs abaixo um museu de coisas insignificantes…
Um museu de guardados mediocres e fósseis das primeiras mulheres que habitaram em meu peito até a evolução da espécie primata da última. Acho que depois de você, todas as outras foram.
E saio agora desses escombros. Acho um walkman e uma fita cassete chamuscada, e em meio a todas as cinzas, eu sacudo o k7, o assopro bastante… Ele tem pilhas e liga e roda a fita… E uma guitarra havaiana chorosa me avisa : Estou apaixonado de novo.
Saio de um museu em que eu estava trancado por nove meses… Solitário… Querendo que “Luzia”, já morta há 12 mil anos, me procurasse e se humilhasse, e eu, como o deus rancoroso que sou, lhe daria golpes de desprezo e diria – aparta-te de mim – mas, você apenas disse – “Atrás do museu, tem uma floresta com uma vista linda e eu te espero LÁ, NÃO AQUI”.
Vc vestia vermelho. Sua boca também estava vestida de vermelho e seus cabelos curtos me encantaram… No Hall de entrada do Meteorito, João Jogava video-game, você o chamou e me disse. Vou te esperar lá fora, mas quem vai decidir o que vai ser queimado, vai ser você…Tem coisas minhas que eu já queimei e eu não posso mais ficar aqui… Vamos João, assim disse e me deu uma caixa de fósforos…
Eu olhei tudo que estava alí : Fósseis de criaturas terríveis; Alfaias Amaldiçoadas; Histórias de Decretos; Inscritos de Escravos; Múmias e Luzia… Que ainda iria me dizer algo, mas só precisou de um estalar de fósforos Léia, só isso, só precisou disso e o fogo tomou o rosto de Luzia e tudo aquilo eu esperei QUEIMAR até a totalidade de todas as cinzas, até se partiram e queimaram imagens de Deuses antigos e as chamas não me atingiam. A chama foi carburada com uma estalada de uma caixa de fósforo, mas elas saiam do meu peito… E ele ardia muito…
Mas só queimou o museu e tudo que estava aqui era passado e o meu presente é você. Mas eu ainda tenho que te tocar… Tenho que dançar, me divertir, sorrir e dormir e acordar… Olhar e dizer que eu posso ser “Um homem Melhor”.
E me recordo que estou em pé, no meio das cinzas. Via um pássaro pegando fogo a voar. A única estátua grega, sincrônicamente apontava para a ave e eu lembrei que era uma fênix. Léia, você me fez lembrar que eu sou uma Fênix.
E eu ligo o walkman. Era como áqueles em que eu usava enquanto via seus longos cabelos andando pela noite e era a única coisa QUE EU NUNCA DEIXEI QUE VIRASSEM CINZAS…
E a fita tinha “Sleep Walk” original, tocada por Santo & Johnny. E eu ia pulando as cinzas e os escombros e todas as múmias mortas queimadas com suas maldições…
Léia, me espera. Estou descendo a quinta… Saindo dos quintos e indo te encontrar, enquanto ouço Sleep Walk sem parar…
Léia… Me Espera?